A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) representou um marco histórico no combate à violência contra a mulher no Brasil. Ao reconhecer que a violência doméstica não se limita à agressão física, a norma avançou ao abranger outras formas de violação de direitos, como a violência psicológica, sexual, moral e patrimonial. Dentre elas, a violência patrimonial é uma das mais silenciosas, muitas vezes naturalizada, difícil de identificar e pouco denunciada. Mas que causa danos profundos e duradouros à autonomia e à dignidade da mulher.
Partindo desse pressuposto, a violência patrimonial é caracterizada por atos que visam controlar, limitar ou anular a liberdade econômica da mulher, por meio da retenção, subtração, destruição ou ocultação de bens, documentos, valores e instrumentos de trabalho. Ainda que muitas dessas condutas ocorram durante a relação, normalmente é no fim das uniões conjugais que essa forma de violência se torna mais evidente.
Sob essa perspectiva, inúmeros comportamentos recorrentes no cotidiano configuram essa forma de violência, ainda que nem sempre sejam reconhecidos como tal. É o que ocorre, por exemplo, quando há sonegação de bens na partilha, por meio da ocultação de contas bancárias, aplicações financeiras, veículos, imóveis ou qualquer outro patrimônio que deveria ser dividido. Também se enquadra nesse contexto o desvio de recursos financeiros, como nos casos em que um dos ex-cônjuges transfere valores para contas de terceiros, vende bens sem comunicar a outra parte ou simula dívidas com o intuito de reduzir o acervo comum.
Além disso, há situações em que o agressor retém documentos pessoais ou instrumentos de trabalho da mulher, impedindo que ela exerça sua profissão ou tenha acesso aos próprios direitos. Não é incomum que bens móveis sejam subtraídos ou destruídos, como eletrodomésticos, móveis da casa ou equipamentos utilizados pela mulher no desempenho de sua atividade profissional, bem como o impedimento de acesso a contas conjuntas ou o bloqueio unilateral de cartões e valores que pertencem ao casal.
Essas práticas, embora muitas vezes justificadas com discursos de mágoa, vingança ou autoproteção, não são meros desentendimentos conjugais: tratam-se de condutas abusivas que violam direitos fundamentais, como o direito de propriedade, o direito à igualdade e o direito à dignidade.
A violência patrimonial é uma forma sutil, porém devastadora, de controle e subjugação. Seu caráter silencioso dificulta o reconhecimento, tanto por parte das vítimas quanto das instituições. Por isso, é essencial ampliar o conhecimento sobre essa modalidade de abuso, promovendo a conscientização de mulheres, operadores do Direito e da sociedade como um todo.
Mais do que garantir a proteção patrimonial da mulher, o combate a esse tipo de violência é um passo necessário para a efetivação de sua autonomia, liberdade e dignidade. Reconhecer e nomear esses comportamentos é o primeiro passo para romper com o ciclo de abusos, e para que nenhuma mulher tenha sua existência condicionada ao medo, à dependência ou ao silêncio.

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